Observatório do Desenvolvimento Capixaba

Cadeias de suprimentos na pandemia de Covid-19

A crise provocada pela pandemia do Coronavírus (Covid-19) vem gerando repercussões diversas e multidimensionais no cotidiano econômico e social dos países afetados. O contexto de isolamento social foi uma necessidade real que se impôs para buscar achatar a curva de contágio e dar maior tempo aos sistemas de saúde para se organizarem. Salvar vidas e garantir o abastecimento contínuo de bens necessários à manutenção da vida humana se tornarão desafios cruciais na atual crise. Afinal, estamos enfrentando um cenário bem próximo ao de uma “economia de guerra”. Esse contexto exige a eficaz coordenação institucional de esforços e a centralização de planos e ações no âmbito federativo.

Sobre a atual gravidade da crise do Covid-19, o jornalista Vinícius Torres Freire ponderou que “em momentos de calamidade oficial e similares, a lei prevê intervenções estatais na atividade econômica, as quais podem incluir tabelamentos ou requisições. Tabelamentos tendem a não funcionar, exceto em situações de guerra de fato. De resto, não adianta fazer requisições se não há produtos, assim como não adianta tabelar o preço do que não existe”. Uma economia de guerra é uma economia de escassez na qual não se pode simplesmente ter mais armas e mais manteiga ao mesmo tempo. Há, nesse contexto, uma grande necessidade de coordenação de ações federativas, inclusive ações que busquem preservar cadeias de suprimentos de bens necessários à manutenção da vida humana.  

Uma matéria jornalística, do Folha Vitória, revelou que os preços de produtos nos supermercados disparam no Estado do Espírito Santo. Os produtos importados ficaram mais caros por causa da desvalorização cambial do real. No entanto, os produtos nacionais também acompanharam o viés de alta. Para fabricar alguns produtos, há a necessidade de insumos importados. A metade do trigo consumido no Brasil é importada, por exemplo. O superintendente da Associação Capixaba de Supermercados (Acaps), Hélio Schneider, por sua vez, disse ao Folha Vitória que, em alguns casos, os produtos fabricados no Brasil, sem relação com o valor do dólar, estão até 50% mais caros do que antes da crise e ele afirmou ainda que os fornecedores da indústria alimentícia subiram os preços. Índices divulgados pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) no final de março, o IGP-M e o IPC, apontaram que os alimentos e as matérias-primas brutas se destacaram nos aumentos de preçosO IPCA, do IBGE, também apontou nesse sentido para os alimentos, inclusive para a Grande Vitória.

A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO, em inglês), por sua vez, espera interrupções nas cadeias de suprimento de alimentos em diversos países e regiões do mundo em abril e maio. Como recomendação geral da FAO, destaco que os países devem buscar atender às necessidades alimentares imediatas de suas populações vulneráveis e, portanto, devem aumentar os seus programas de proteção social. Para esse tipo de quadro geral, devemos adotar a responsável perspectiva do princípio da precaução.

Estudo do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV) aponta que a pandemia pode até dobrar o desemprego no Brasil. Segundo o estudo, a destruição de empregos, no Brasil e em outros países, não será comparável a nenhuma outra recessão dos últimos 40 anos. Para a pesquisadora Sílvia Matos, “no período recessivo recente aumentou a informalidade, houve uma válvula de escape para garantir emprego. Neste momento, a natureza do choque não permite isso. Não tem muito o que fazer para preservar esses empregos. Tem de preservar a renda”.  

No sentido de preocupação com a vida humana e o bem-estar social, a coordenação institucional de esforços federativos precisa levar em conta os aspectos logísticos de abastecimento e de manutenção da renda das famílias. Afinal, já estamos enfrentando diversos tipos de problemas nas cadeias de suprimentos globais, algo que revela o grau de autonomia relativa dos países, e inclusive enfrentamos grandes desafios na logística doméstica de abastecimento de alimentos. O Brasil está tendo a oportunidade de repensar a construção de suas reservas estratégicas de capacidades produtivas de bens e serviços. Seremos capazes de aproveitar esse aprendizado?

O setor de transporte é um setor fragmentado, familiar e pouco digitalizado. Na atual crise, a logística digital precisará crescer junto com o comércio eletrônico. Resta saber se há capacidade para tanto em um contexto de descoordenação federativa de esforços. Em um contexto de “economia de guerra”, não é razoável contar com os mercados e os sinais dos preços livres para dar respostas satisfatórias à população.  

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