Na semana passada, o Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN), em parceria com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgou os resultados da série do Produto Interno Bruto (PIB) dos Municípios do estado do Espírito Santo considerando o período de 2002 a 2017.
Como informado pelo IJSN, a metodologia de cálculo visa garantir resultados homogêneos, comparáveis entre as Unidades da federação (UF’s) e integrados aos procedimentos do Sistema de Contas Nacionais do Brasil (PIB do Brasil) e Contas Regionais (PIB do estado). Em termos gerais, a construção do PIB dos municípios equivale à estimativa da estrutura de participação de cada município nos valores adicionados estaduais de acordo com critérios específicos para cada atividade econômica. Dessa forma, o PIB dos Municípios indica toda a produção de bens e serviços em determinada localidade em um ano específico, medida em valores monetários correntes.
Da série divulgada alguns pontos merecem ser destacados. Em primeiro lugar é preciso mostrar que está havendo uma perda de participação da Região Metropolitana da Grande Vitória (RMGV) no PIB capixaba. Em 2002, início da série, a RMGV concentrava 62,71% da produção gerada no estado, chegando a concentrar em 2004, 64,15%. Dez anos depois, em 2012, a participação do PIB da RMGV no PIB capixaba era de 50,79%, caiu para 49,88% em 2013 (menor participação na série histórica disponibilizada). No entanto, no auge da crise recente, em 2016, em que todas as microrregiões do estado tiveram seu PIB reduzido, observou-se uma da concentração da produção na RMGV (57,56%), que com a lenta recuperação de 2017, retomou-se também a tendência anteriormente observada de desconcentração da produção de riqueza no estado. Assim, em 2017, a RMGV passou a contribuir com 55,11% do PIB do Espírito Santo.
Por outro lado, as demais microrregiões no interior do estado, ainda que com estruturas produtivas bem diferenciadas entre elas, têm ganhado participação no PIB capixaba. Na primeira década dos anos 2000, com os crescentes investimentos em mineração e petróleo na microrregião Litoral Sul foram responsáveis por permitir que essa microrregião que em 2002 contribuísse com 5,95% da riqueza gerada no estado, em 2014 chegasse a contribuir com 20,87%.
Investimentos pesados em plantas de mineração e no setor de petróleo foram cruciais para dinamizar a economia do conjunto de municípios que compõem essa microrregião, a saber, Alfredo Chaves, Anchieta, Iconha, Itapemirim, Marataízes, Piúma, Presidente Kennedy e Rio Novo do Sul, sobretudo Anchieta, Marataízes e Presidente Kennedy.
No entanto, a experiência observada nesses municípios lança luz sobre os riscos da dependência exclusiva desses setores dinamizadores da economia local. O caso mais dramático nesses municípios é, sem dúvida, Anchieta. Este munícipio, dependente das operações da mineradora Samarco, em 2010 (ano em que chegou apresentar sua maior participação no PIB capixaba), a participação do município no PIB capixaba foi 5,20%. A título de comparação, essa participação é superior à observada em microrregiões como Caparaó, Nordeste, Noroeste, Sudoeste Serrana e Central Serrana no mesmo período. Com o desastre ambiental de Mariana em novembro de 2015 e a consequente paralisação das atividades da Samarco Mineradora em Anchieta, a participação do munícipio no PIB capixaba foi de 0,65% em 2016 e 0,71% em 2017. Em valores correntes, o PIB do município em 2017 foi inferior ao verificado em 2004, e em 2016 apresentou o menor valor em 15 anos. Com uma estrutura produtiva completamente dependente de commodities não amigáveis ao meio ambiente, o município se encontra numa situação de penúria econômica.
Em outras microrregiões como a Central Serrana, Caparaó e Sudoeste Serrana, por exemplo, com estrutura produtiva completamente diferente da Litoral Sul, também conseguiram ampliar sua participação no PIB capixaba na série estudada, ainda que em menor proporção. No entanto, o que é preciso destacar no caso dessas microrregiões é natureza das atividades econômicas que ali se desenvolveram ao longo do início desse século que permitiram a um conjunto de municípios como Domingos Martins, Venda Nova do Imigrante, Santa Teresa, por exemplo, terem seu PIB ampliado em todo o período, inclusive no auge da crise em 2016. Esses municípios não são dependentes exclusivamente de commodities. Em Venda Nova do Imigrante, cuja atividade cafeeira se destaca, o turismo e um “cluster” de cafés especiais também são referências como dinamizadores da economia local. Santa Teresa e Domingos Martins estrategicamente localizados na região das montanhas, conseguiram, sobretudo Domingos Martins, agregar valor ao turismo local possuindo glamorosas pousadas e explorando as rotas turísticas das montanhas.
Dos resultados evidenciados na série histórica do PIB dos municípios capixabas também devem ser ressaltados os casos preocupantes dos municípios que compõem a a microrregião Nordeste, a saber, Boa Esperança, Conceição da Barra, Jaguaré, Montanha, Mucurici, Pedro Canário, Pinheiros, Ponto Belo e São Mateus que tiveram sua contribuição para a PIB capixaba reduzida no período. Em 2002, esse conjunto de municípios participava com 4,29% do PIB do Espírito Santo e em 2017 esse percentual foi de 3,97%. Trata-se da única microrregião capixaba do interior que viu a participação do seu PIB na economia capixaba encolher no período. Uma cidade turística como Conceição da Barra, que possui praias lindíssimas não conseguiu dinamizar seu turismo como Domingos Martins fez com suas montanhas no período mais recente. A título de comparação, Conceição da Barra em 2002 possuía PIB superior a Domingos Martins. Em 2011, o PIB desses dois municípios eram semelhantes, no entanto, a partir daquele ano, Domingos Martins conseguiu ampliar consideravelmente seu PIB e Conceição da Barra praticamente se estagnou e foi fortemente afetado pela crise em 2016. Domingos Martins, por sua vez, continuou ampliando seu PIB ainda em crise, e em 2017, a riqueza gerada nesse município era 1,66 vezes a gerada em Conceição da Barra.
Uma leitura cuidadosa dos dados disponibilizados pelo IJSN a respeito do PIB dos municípios capixabas revela a fragilidade de estruturas produtivas baseadas em commodities que sustentam a base da economia capixaba nas regiões Metropolitana e Litoral Sul. Essas regiões quando são afetadas por choques de preços dos seus produtos nos mercados internacionais e por desastres ambientais não conseguem resistir. Deixam de gerar riqueza, postos de trabalho, oportunidades e melhoria da qualidade de vida dos cidadãos que ali residem. Por outro lado, vimos também na primeira década desse século, belos exemplos no interior do estado de regiões que dinamizaram suas economias a partir da criatividade e da inovação. Há municípios no Espírito Santo com potencial de crescimento sustentado por políticas voltadas à agregação de valor aos produtos locais, valorização do turismo e cultura capixaba. Que esses exemplos se espalhem por todo o estado.